Bate o medo de se candidatar a promoções, você tem a sensação de que suas conquistas são fruto de sorte. Os sintomas são familiares? Junte-se ao clube da síndrome do impostor.

Apesar do nome popular, não se trata de síndrome, pois a sensação de ser um impostor no trabalho não é reconhecida como doença.

Mais preciso, então, é o termo “fenômeno do impostor”, cunhado pelas psicólogas americanas Pauline Rose Clance e Suzanne Imes em 1978.

Chamar essa sensação de síndrome, aliás, é colocar a culpa no indivíduo quando trata-se de sentimento generalizado, causado pelo mundo do trabalho, afirma Maria da Conceição Uvaldo, coordenadora do serviço de orientação profissional da USP.

 

Performance

Esta época é marcada por cobranças de resultados, o que o doutor em psicologia social e do trabalho Wilner Riascos chama de culto da performance: “Estamos permanentemente sentindo a necessidade de estarmos no topo, de sermos admirados”, diz.

Num mercado com pouca mobilidade é difícil não se comparar ao sucesso alheio. Para quem se sente impostor, essa comparação é central.

As mudanças tecnológicas contribuem para a insegurança. “Você tem a impressão de que está desatualizado. Tudo é imediato”, diz Maria. “Isso não é uma síndrome: 99% das pessoas têm essa sensação.”

 

Gêneros

Quando começou a ser estudado, o fenômeno era relacionado a mulheres. Pesquisas atuais mostram que homens também apresentam o comportamento. A posição da mulher no mercado, porém, pode intensificar o sentimento.

“A gente ganha menos e tem que provar mais o quanto sabe. Se você é sempre questionada, essa sensação pode aparecer mais forte”, diz Maria.

A desenvolvedora Caroline Soares diz que ser mulher na área de tecnologia – uma minoria – pesa. “Existe a obrigação de se provar tecnicamente toda hora, isso atrapalha. Acontece de eu perder oportunidades por não me achar boa o suficiente”, diz.

Nessa área, síndrome do impostor é assunto recorrente, diz Cynthia Zanoni, criadora do projeto WoMakers Code, que promove oficinas e debates relacionados a tecnologia. “Elas acreditam que é preciso saber muito desde o início para conseguir espaço.”

Ela mesma quase não concorreu a uma bolsa na faculdade. Na época, achava que os outros candidatos estudariam em escolas melhores e que não tinha o conhecimento necessário, apesar de acumular experiência na área.

Foi uma professora que lhe disse que ela era capaz e que aquela hesitação tinha nome: síndrome do impostor (e, sim, ela conseguiu a bolsa).

 

Perdas

Não ver as possibilidades que se apresentam é uma das principais consequências do fenômeno, de acordo com Marcia Vazquez, gestora do capital humano da Thomas Case. Como você não se acha bom, a tendência é desistir.

A americana Valerie Young, autora do livro “The Secret Thoughts of Successful Women” (“Os Pensamentos Secretos de Mulheres Bem-Sucedidas”), lista outras consequências para a carreira.

O profissional tenta não se destacar (para não ser descoberto como fraude), trabalha demais para compensar o que vê como incompetência ou procrastina, pois enquanto não entregar nada não poderá ser julgado.

Os efeitos não ficam restritos à carreira. “Se a pessoa não reconhecer que suas convicções estão erradas, quanto mais demanda tiver, mais ansiosa ficará”, diz a psicóloga e coach Renata Arrepia. Problemas físicos, como dor de cabeça e mal-estar, também podem aparecer.

Como uma gripe, diz Wilner Riascos, se for leve, a síndrome do impostor pode ser tratada sem ajuda médica.

Uma recomendação é conversar com amigos sobre a carreira, para perceber que os outros também têm inseguranças. Outra é sair das redes sociais, onde todos parecem bem-sucedidos.

Mais experiência, porém, não resolve o problema. Às vezes, o sucesso intensifica os sentimentos de impostor, porque a pessoa acha que está enganando mais gente, segundo Valerie Young.

Em casos mais sérios, é bom procurar terapia. “Um psicólogo que trabalhe com orientação de carreira e ajude a trabalhar as questões que levaram à construção desse autoconceito”, aconselha Riascos.

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